Memórias 305 Jairo Ferreira

18.10.2018

A morte não se explica! Ela chega para todos, e é a nossa única verdade. Tudo mais são passagens, encontros e desencontros entre inquietudes e ostentações idiotas como essa necessidade de poder que os seres humanos se alimentam! Ainda assim a vida me parece estranha quando já velho vamos ficando e os verdadeiros e poucos amigos partindo. Mesmo o viver vai se tornando um espaço de perdas e vazios. E já não somos mais que uma curiosidade para os outros. Reduzimos tudo ao imediato mesmo entre divagações, sonhos e pensamentos nebulosos. Mas aqui o descrédito dado ao pensamento dos criadores mais velho é assustador! Definitivamente no Brasil, a velhice não é para os fracos. O esforço para sobreviver e criar para que se tenha um país melhor, é o mesmo de um jovem de 20 anos! Triste. Falava muito sobre isso com o saudoso e querido Jairo Ferreira. Ainda éramos jovens, só que já velhos pelo ofício. O vi muitas vezes sofrer calado por não conseguir filmar ou editar seus ensaios cinematográficos. Estava sempre cheio de vida, sonhos, planos e ideias só que no reino da estupidez cultural do país. Infinito em seus muitos espaços, não entendia bem a canalhice e má fé do poder dominante do regime. Quis muito ser gostado, amado e entendido em seus textos e atitudes. Era bem mais que um crítico oficial, mas um obstinado pelas possibilidades infinitas da experimentação. Amávamos o cinema do Orson Welles. Passávamos horas discutindo os seus magníficos enquadramentos e projetos. Sempre que vinha ao Rio, ficava em minha casa e conversávamos sobre cinema, política, traições/traíras, erotismo até o amanhecer. Adorava beber sem nunca romper o estado de lucidez. Cometeu lá seus erros? Mas quem não os comete? Acho que dos meus trabalhos só gostava muito da CRÔNICA DE UM INDUSTRIAL e do $ANTO E A VEDETE pois só me falava bem dos dois. Um dia me telefonou de São Paulo às três da manhã me pedindo autorização para usar pedaços da CRÔNICA pois queria fazer um média chamado "A MÚSICA DA LUZ"! Claro que dei, e infelizmente o filme não saiu. Dos realizadores experimentais nunca o vi falar mal de ninguém. Também nunca me esqueci que a nossa primeira conversa na redação da Folha foi sobre o cinema do Tonacci, na casa de quem eu sempre ficava em Sampa! Daí pra frente fomos bons e cuidadosos amigos. Amigos desenraizados da caretice, da máfia que sempre nos odiou, da burocracia e do capital. Amigos, não rebanhos na degenerescência dos sonhos proibidos. Queríamos os avessos das eternas certezas agonizantes do poder. Queríamos o desaprender da falsa boa educação e da ordem! ( P/Renato Coelho). Luiz Rosemberg Filho/RÔ

Renato Coelho