Memórias 310 Fiz do cinema um jogo de xadrez comigo mesmo

20.10.2018

Logo no início depois de passar pela pintura e pelas Colagens que me acompanham até hoje, pensei em escrever para o teatro. No CPC descobri muito timidamente a mise em scène. O espírito encenador veio anos mais tarde vendo as peças montadas pelo Teatro OFICINA, pelo Sol de Ipanema, pela República das Bananas , pela descoberta de Brecht e por fim pelo encantamento com o filme "TERRA EM TRANSE". Li num velho livro editado em Portugal um pensamento de Artaud que me acompanhou por muito tempo: "Reteatralizar o teatro." E por que não pelo cinema? Trabalhar a "cotidianidade" em dimensões épicas como fizemos o "A$SUNTINA DAS AMÉRIKAS" e décadas depois "DOS CASAMENTO$" e "OS PRÍNCIPES" ainda inédito. Do cotidiano fomos para a História em "O JARDIM DAS ESPUMAS" e o "GUERRA DO PARAGUAY". Da história para uma análise corrosiva da política em "CRÔNICA DE UM INDUSTRIAL" e em quase todos 50 curtas-metragens. Fiz do cinema um jogo de xadrez comigo mesmo sempre me livrando de certezas. Sempre soube o que queria, mas na hora de filmar zerava tudo e ia reaprender com o lado humano dos atores e técnicos. Longas conversas com Shakespeare, Molière, Tchekov e Brecht. A todos devo muito da fantasia e do humor sem rebuscar muito o discurso cinematográfico pois não faço cinema para o meu ego! Nada contra quem o faça bem como Antonioni, Bergman ou Resnais. Fico entre Welles, Godard e Straub. Ao descrédito do cinema comercial quis sempre para mim que a criação fosse sim um grande prazer de imagens e sons. E isso sem crer em nenhum tipo de ilusão. Fazíamos cinema em busca de um mínimo de encantamento em anos muito difíceis entre a fraqueza, a ordem e a estupidez. De certo modo a mise en scène de todos os meus trabalhos obedecem fundamentalmente ao pensamento, a música e a história do saber. E se a noção do sucesso apagou a criatividade perdida, nosso cinema reencontrou sua integridade edificante na eficácia do desafio de criar na contra mão! Enfim, cada filme como um ato poético de sabotagem no discurso do medo e da ordem. Ainda bem. (P/ Luciana Fróes) Luiz Rosemberg Filho/RÔ

Luciana Fróes