Memórias 4 O $anto e a vedete

03.01.2018

No começo era só o dinheiro, sem ambição poética alguma. De fato não se pode negar a sua importância num tempo tão vagabundo como este nosso. Desempenha hoje o papel de Deus! Um deus não amanteigado reproduzindo ódios, guerras, desigualdades e fome! De qualquer forma, tanto um deus como o outro jamais enobreceram o que seja, pois são só representações bufas de poder! E nada mais carregado de ódio que o poder! E curiosamente luta-se por ele sempre de maneira baixa na sua pobre existência de egos vazios sem sensação humana alguma! Apenas, uma plenitude vaga para boçais desfamiliarizados das relações afetivas e também humanas! Cabia e ainda cabe a nós não sermos iguais. E não fomos! E muitas vezes mais os porcos da burocracia intensificaram seus ódios no definhamento de nossas forças. Pena. E como foi que tudo começou com o nosso filme "O $anto e a Vedete"? Fui convidado por um querido amigo (a quem o filme foi dedicado) para fazer um filme de encomenda. Na época era para ser um filme kitsch/pornô com belas mulheres nuas. Era para ser do jeito que o produtor queria: "sem sentido algum", como eram as pornochanchadas! Juntei o bando dos 4 (Luthero Luiz, Nelson Dantas, Renato Coutinho e Wilson Grey) , e fomos mudando, e melhorando tudo! Em dado momento o produtor deixou de entender que estávamos fazendo outro filme, sem abrir mão das suas indicações: belas mulheres peladas! Quem o fotografou foi o querido Pedro de Moraes, logo depois da sua participação com Glauber no "Idade da Terra". Pedrinho era solar, sério e gaiato. Como era verão suava muito ao fotografar os detalhes íntimos das nossas lindas mulheres. Mas fez uma das mais belas fotografias do nosso cinema. Seu estilo com a luz, é só seu dando organicidade as imagens e indo do realismo ao erotismo com sublimidade! O possível mal-estar do argumento que era fraco, pois raro são os produtores que sabem escrever, Pedrinho com suas imagens bem sucedidas fez o diferencial. Claro que fomos boicotados pelos burocratas da Embrafilme que ajudaram o filme não existir nos cinemas! Agora, quem se lembra de algum dos energúmenos da burocracia, nos dias de hoje? Nós continuamos! Estamos aí cuspindo no prato deles, num processo de desalienação do cinema. Atravessamos a falsa moralidade deles, na criação de um estilo próprio. O $anto, que de santo não tem nada ficou como uma rica experiência poética e bem humorada para todos! Foi o filme possível, sem ter que vender a mãe na zona! Sou grato a todos, e a Pedrinho pela singularidade das suas imagens. Sua busca de significação para além das contradições de um filme que era feito para dar dinheiro, e só! Fomos além da podridão patronal. Matando a inocência e cantando o santificado Erotismo! Nunca nos tocou a invenção da moralidade, da imundice dos discursos que nada dizem, da adequação a religião e ao trabalho escravo. Trabalho escravo agora aceito por um governo anti-erudição, com a animalidade latente e feroz da Casa Grande! Ainda assim Pedro de Moraes não cedeu em nada, e foi cúmplice das nossas tantas excentricidades poéticas de formação. Fez do mal-estar patronal um cadáver colorido e falante, sem nada para dizer. Bufões né? Luiz Rosemberg Filho/Rô