memórias 31 Os enquadramentos
Enquadramentos são sim deslocamentos na região do irracional, de tal modo que tudo pode ser pensado. Talvez um pouco como os sonhos, inviabilizando certezas e dando significação a vitalidade do “ser ou não ser” das dúvidas. Não por acaso penso muito no cinema mudo. Os enquadramentos são um pouco como as colagens que vou montando ser uma ordem de prioridade. Juntando essência, lógica, história, poesia, pedaços, palavras, cores, pensamentos, erotismo, sonhos, imagens, afetos, desejos, perdas… Digamos que são acessos a caminhos dentro da dor da criação. No dizer de Paul Valéry: “A dor é aquilo que sentimos de mais nosso e de mais estrangeiro”. Por mais segurança que se tenha, tateia-se nas entranhas da estranheza dos impulsos e pulsões. É uma tolice querer definir com exatidão matemática, o surgimento mágico de um belo enquadramento. E aí sempre tive como referência simbólica o cinema de Antonioni. Mestre de uma certa arquitetura do olhar. Da imagem como questão e conceito do belo. Ora, como criar um enquadramento original que não seja comum ou televisivo? Claro que é preciso partir de um bom roteiro. Depois uma cenografia inventiva que não seja só naturalista. E entre o olhar e o espaço das personagens existe o que eu chamo de vazios dialéticos. Digamos que o mistério dos belos enquadramentos surgem da suprema graça da poesia de cada elemento. A TV de um modo geral não pensa a construção do olhar, e tudo vai sendo feito numa espécie de síntese da velocidade. A desculpa é que cada minuto custa muitos milhões! Será? No cinema você pode usar o bisturi simbólico para fazer de um só espaço, muitos