Memórias 44 A crítica de cinema

22.01.2018

Tendo feito os filmes que fiz e ainda faço, não posso esperar um entendimento imediato. Faço sim um cinema anti-apaziguador de contradições. Ao longo da minha existência fui muito censurado e vaiado por só gostar de feijão com arroz no prato. Na vida gosto do improvável, do inconcluso e se ainda for possível de um retorno a uma depuração do erotismo pela via da poesia e das artes plásticas. Amo a literatura de SADE e o cinema da crueldade de ARTAUD. Suas possibilidade criativas, são infinitas. Ainda ontem vaiavam “O Jardim das Espumas”, e hoje o aplaudem. Sei que nunca foi um filme fácil, mas reflete bem os Anos de Chumbo sem ser panfletário. Volto um pouco como encenação próxima a ele, no ainda inédito “Os Príncipes”! Ambos servindo a uma função desestabilizadora de certezas políticas, morais e partidárias. Nos “Príncipes” expomos com clareza a formação da má-consciência! Mas não é o Brasil de hoje? É preciso aprender a abster-se de provocações idiotas! Todo mundo filma, todo mundo critica e o cinema deixou de ser inventivo e poético para se transformar numa arma de afirmação de egos. Restos de um saber crítico afetivo duvidoso, repelem a criatividade ocupando cargos de jurado em festivais, comissões de financiamento e na burocracia. O cinema pensado é atacado por dentro e por fora. Mas, talvez seja mesmo inconcebível que numa republiqueta miserável se possa pensar em fazer um cinema pensado e poético. Trabalhei alguns anos com a Crítica no velho INC. Tive todas as facilidades para me tornar um crítico, mas quis dar alguns passos diferentes. Conhecia bem meus companheiro de trabalho. Quase todos pensavam em um dia fazer cinema. Mas fazer cinema sério no Brasil nunca foi fácil. Gostava de ler o Muniz, o Paulo Emílio, o Alex, o Sérgio Augusto, o Zé Lino, o Rogério Sganzerla, o Jaime Rodrigues, o Gustavo Dahl, o Sergio Santeiro e o queridíssimo Jairo Ferreira. Hoje tem uma nova geração quase toda no computador, mas as vistas já andam perigando. Mas, observo que o nosso cinema em não sendo a estupefação do espetáculo de imitação dos “Rambos XXIV” ou da “Mulher Maravilha”, seduz pouco e cai num excesso de onipotência analítica infantil. Pena. Mas quando posso leio a doce e furiosa Samantha Brasil, Filippo Pitanga, Fernando Oriente, Carlos Alberto Mattos, Rodrigo Fonseca, Camila Vieira…. Mas sempre achei e dizia para o Jairo, que criticar era abrir caminhos num esforço poético para se ir além do filme! A crítica deveria ser geradora de encontros e afetos na pequenez dos lançamentos confessadamente comerciais. Cair de pau nos lançamentos das comédias medíocres da Globo Filmes é fácil né? Difícil é defender um filme como “UNICÓRNIO” com profundidade e poesia. E se é verdade que a “arte antes de tudo tem de embelezar a vida, deve em seguida dissimular ou reinterpretar toda a feiura”. É preciso que o trabalho do crítico seja denso e profundo como ponto de partida e chegada. Sempre me irritou muito o senso comum das bolinhas, estrelinhas e listas dos melhores do ano. Sempre passei batido! Sensibilidade analítica/poética são interrogações e não egos absorvidos pelo senso comum. (para Paulo Augusto Gomes) Luiz Rosemberg Filho Rô.