Memória 206 Ainda sobre OS PRÍNCIPES
É preciso esclarecer logo sobre meu último longa: não era o projeto que eu queria filmar. Mas, não tendo recursos para fazer o COMMEDIA DELL’ARTE, filmamos OS PRÍNCIPES num plano único de humor ácido e HORROR! Um filme de abutres, arrogâncias, dores, sujo mais belo, e para quem souber ver impuro, imoral e político. Dizer que é um filme contra a mulher é burrice. Não ganhou seis prêmios bons no Festival de Pernambuco por ser reacionário. É sim antifascista e cai acertadamente nesse triste momento da nossa história. Com o diferencial de não ser partidário. Está além do nosso triste joguinho por ser plural, ousado e de vanguarda sim! É um trabalho de seres enclausurados na dor e na alienação. Hoje já posso dizer que o fiz com um ódio silencioso de tudo. Não tem beleza mas ali está o Brasil. Digamos é um filme vomitado tipo a escrita de SADE. É também uma volta ao meu passado no inédito BALADA DA PÁGINA 3, que se perdeu por incompetência de um dos produtores que ninguém gostava. Por sorte salvei o nosso JARDIM DAS ESPUMAS, homenageado de certa forma em OS PRÍNCIPES. É claro que como postura o último é bem melhor que o primeiro, que eu nunca gostei apesar de ter sido feito com amigos queridíssimos. BALADA e OS PRÍNCIPES falam de uma parcela insignificante da juventude desocupada, explorada, violenta e vazia. Perfeito para esse momento onde um ser humano perverso e desprezível ocupa o poder na base da traição. Goza em fazer o mal buscando o sofrimento e a imobilidade em tudo e todos. Mas parece que a perversão está na ordem do dia no mundo, e muito aqui no continente. É como diria Barthes: “O cru como alimento da linguagem”. O mestre Pasolini corria nas minhas veias com o seu ACCATONE e SALO/SADE. Não é o filme dos sonhos de ninguém, mas o filme possível. Ainda assim ousei e ousamos não ser a chatice do politicamente correto na criação, sentimentalista ou comportado. Filmamos o abismo sem fim em que estamos vivendo. Um filme sem trava de segurança ou freios. Acabei brigando de morte com algumas pessoas, mas me livrei de muitas teias de aranha. Sigo em frente como amigo fiel dos amigos! Não é preciso trair! (Pela memória de Cidinha Milan que trabalhou comigo no A$SUNTINA DAS AMÉRIKAS). Luiz Rosemberg Filho/Rô