Memórias 214 E qual é o futuro do cinema ?

18.09.2018

Como inserir a Beleza num mundo tão às avessas onde o normal é roubar, enganar, trair e se necessário até matar? Bem, o mundo de Bach, Tchekov ou mesmo Brecht não era melhor. A Revolução Industrial trouxe um acesso à máquina como dimensão ilimitada da produção. Pode-se produzir tudo o tempo todo. A Revolução Tecnológica nos trouxe o computador e a sua linguagem digital. No cinema a película foi substituída pelo cartão eletrônico minimíssimo e o filme rodado pode ser infinitamente modificado na ilha de edição. E qual é o futuro do cinema? Gerd Bornheim diz que: "Nunca se produziu tanta arte ruim quanto hoje em dia". E o que foi feito do humano, da complexidade e da arte? Queiram ou não sempre se ouvirá Mozart, se verá Chaplin e se lerá Shakespeare. Vivemos hoje um distanciamento real do respeito pelo humano lado das relações, da criação e da vida. O ser humano hoje vive a mercê da máquina que o reduz a uma peça descartável. E a essência humana frente a beleza, a poesia, o desejo, o prazer e o gozar? Virou antiguidade? Qual identidade da beleza deve predominar: a da falsa ordem política/religiosa ou a da desordem? Ênfase ao teatro visceral de Artaud e ao cinema de Godard. Penso aí no belo que não precisa de explicação. Ele é! Um pouco como GUERNICA de Picasso. Penso na relação de DOM QUIXOTE com SANCHO PANÇA a abandonarem a ordem do real. A Beleza pode ser tudo! Como cineasta não vejo muito sentido num cinema narrativo como nas novelinhas da TV. Criar é sim uma rica experiência de vida. E vi isso muito claramente no passado vendo Glauce Rocha criando num filme policial menor, e Analu Prestes fazendo o mesmo num filme maior como foi o nosso delicado e amoroso A$SUNTINA DAS AMÉRIKAS. Vendo-o hoje, parece ter sido feito ontem. Não envelheceu pois o país só piorou. Ênfase a simplicidade da fotografia de Renaud Leenhardt. É essencialmente um trabalho quase artesanal bem sucedido. Um filme de linguagem popular que provocou ódios e paixão, sem uma só imagem de submissão à ordem! Sempre tive muito orgulho dessa nossa teatralização cômica dos muitos horrores dos Anos de Chumbo. E creiam, eu não tinha o udigrudi como referência, e sim as chanchadas ornamentadas por uma visão realçada por Brecht. Ou, o fim dos valores absolutos e a Beleza como a desordem a ser seguida. Seguimos! (P/ Rona Neves) Luiz Rosemberg Filho/RÔ

Rona Neves