Memórias 245 Nos anos 70 sai do Brasil marcado por impossibilidades, brutalidades e censura.

28.09.2018

Nos anos 70 sai do Brasil marcado por impossibilidades, brutalidades e censuras! Tudo era proibido: filmes, jornais, livros e até pensamentos! A violência era usada pelo poder como sua marca registrada. Filmes patéticos como INDEPENDÊNCIA OU MORTE eram feitos para que se acreditasse que vivíamos num democracia! Escondiam a verdadeira história, os desaparecimentos e as roubalheiras da Transamazônica a ponte Rio/Niterói. Vendiam pela mídia que era bom que fosse assim: uma overdose de horrores e proibições. O trabalho era um espaço sem renovação alguma sempre igual e cotidianamente uma lenta substituição da vida pela morte. Sai fora! Era um Brasil burro e bitolado onde só a crueldade do vazio era o sagrado. Tinha rabiscado na minha mesa de trabalho com gilete no INC um pensamento de MACBETH que diz: "Desgraçado país quase temeroso de conhecer-se a si mesmo!" Era o Brasil da aversão ao pensamento e ao humano. Bem, fui levando O JARDIM DAS ESPUMAS para uma das mostras de vanguarda do Festival de Berlim, e por lá fiquei. Na época onde o filme fosse exibido era vaiado. Usei a ficção científica para colocar questões políticas misturando Artaud a um país nazista, e a sua resistência vivida por uma mulher. Quase quatro décadas depois é o meu filme mais significativo do Continente, juntamente com alguns curtas experimentais, sempre! Vendo o JARDIM hoje (ainda que mexido pelo distribuidor na Europa), o filme ilustra bem um pensamento de Artaud que diz: "Ninguém mais sabe o que é viver, porque viver é afirmar-se em si mesmo, a todo instante, encarniçadamente, e esse é o esforço que o homem de hoje não quer mais fazer." Me lembro bem que a primeira coisa que fiz chegando em Paris, foi deixar a mala no pequeno hotel, e ir ver no cinema a versão original sem cortes com mais de três horas de O LEOPARDO. Nesse esplendoroso filme de Visconti, começava os meus anos de Europa anos 70. Luiz Rosemberg Filho/RÔ.