Memórias 257 A presença da música clássica no meu cinema

02.10.2018

Sempre gostei da presença da música clássica no meu cinema. Acho-a solar na sua magia de encantamento revelando-me o divino e o absoluto da sua existência. Sem a presença de Bach no CRÔNICA DE UM INDUSTRIAL a solidez das ideias seria apenas as inquietações de um ainda jovem entrando no mundo adulto! Aqui sempre um mundo feio desprovido de um estado democrático. Como diz Jean-Claude Carrière no seu genial "Fragilidade" me apresentado ainda pelo Tonacci: "Não somos mais do que um momento antes de desaparecer corpo e bens, no escuro, para sempre. Nós só somos porque um dia não seremos mais." Tal pensamento tão necessário é sim o anti-clichê do espetáculo comum no cinema de Hollywood. Ou seja, trago o pensamento e a música como uma espécie de tapeçaria de um grande quebra-cabeça girando em círculos permanente de infinitos encontros e desencontros. E o cinema é justamente essa passagem contínua de encantamento pelo ainda belo na empobrecida história da humanidade dividida entre as guerras e a fome. Ou, tantas fragilidades sem heroísmo algum onde o poder é só uma mancha profunda de sangue e traições. De certa maneira a música clássica assume seu papel de traduzir contradições em imagens vigorosas e poéticas. Eu já sabia antes mesmo de rodar o CRÔNICA DE UM INDUSTRIAL, que no seu fim seria com A MORTE DO AMOR de "TRISTÃO E ISOLDA" de Wagner. E chegavam em casa depois das filmagens e quando era possível ouvia só essa área muitas vezes. Ela foi tomando uma forma sagrada que me revigorava na criação das imagens dos dias seguintes, me servindo muito ao olhar! Foi sim a gênese da transcendência do comum rumo as minhas muitas devastações internas que se amplificam ao infinito das minhas amarguras com relação ao real desencanto com a política, Triste. Luiz Rosemberg Filho/Rô