Memórias 278 Fiz muitas coisas legais pelos outros

09.10.2018

O cinema tem muitos caminhos obscuros onde impera o tédio, o medo, a fadiga, as traições e até mesmo a humilhação. E onde falta afeto, impera a truculência animal! Por outro lado de um modo geral muitos cineastas se acham deuses e adorariam ter um harém! Não aguentam uma, mas sonham com muitas. Já não é o ofício mas o sonho de uma virilidade eterna! Bem, pus a minha esperança nos poucos amigos que fiz e não no cinema. Entre trapos, dores e remendos o cinema segue entre a timidez e o vulgar com medo de ser ridículo. Mas já não seria isso a indústria de confetes coloridos? O mestre Mizuguchi dizia para seu roteirista Yoshikata Yoda: " Você tem que transformar o odor do corpo humano em imagens (...), descreva-me o implacável, o egoísta, o sensual, o cruel (...), não há nada além de pessoas repugnantes neste mundo." Mizo não foi só um grande cineasta mas um profeta filósofo. Um bom remédio para os nossos males de burrice ao querermos erguer uma indústria de enlatados coloridos! E vendo esse nosso cinema sendo defendido por alguns críticos menores, infectos e pustulentos mais me refugio no passado do saber. Volto a repetir: nunca me importei de não ser gostado pelas pequenas flores de estufa! Meu equilíbrio não depende, nem nunca dependeu dessa gente pequena, recalcada e rancorosa. Muniz Vianna alguma vezes me perguntava se eu não ficava danado de ser esculhambado nos jornais? Nunca vou me esquecer do seu delicado cuidado em querer me proteger como um amigo mais complicado. E eu lhe dizia na lata: " -Se preocupa não que eu sei o que estou fazendo! E cá entre nós conhecemos a crítica né?" Ríamos. Ele ficava mais preocupado que eu. Não éramos íntimos mas nos respeitávamos. Uma vez tive uma briga feia com o Salviano Cavalcanti de Paiva por uma besteira sem importância alguma que eu já nem me lembro o motivo. Ele foi pedir minha cabeça ao Munniz. Como amigo dos dois, o Muniz não me mandou embora e eu fiquei onde estava na mesma sala com o Salviano. Passado algum tempo voltei a falar com ele que era até uma pessoa sensível, mas muito estourado. Por nada fazia um banzé desnecessário. Criava inimigos sem necessidade. Será que foi um homem feliz? Penso que a felicidade te obriga a ter uma certa elegância. Um espaço interior um pouco mais nobre. Gostar não por palavras mas por gestos! Como bem dizia Henry Miller: "Gosto dos homens que carregam o tempo no sangue..." Não levei a briga a sério e nem podia pois trabalhávamos na mesma sala! Tínhamos que nos suportar com leveza! O INC foi o meu serviço militar que eu não fiz. Fiz muitas coisas legais pelos outros. Desde Tonacci a Mazzaropi. Hoje acho que o INC, a EMBRAFILME e mesmo a ANCINE poderiam ser bem melhores. Pena. (P/Daniel Tonacci) Luiz Rosemberg Filho/RÔ

Daniel Tonacci